Lídia Maria de Melo
Apesar do início do horário de verão, que engoliu uma hora de meu precioso tempo, consegui assistir a um filme ontem. Aleatoriamente, no Netflix, escolhi "Olhos da Justiça", dirigido por Billy Ray, com Chiwetel Ejiofor, Júlia Roberts e Nicole Kidman.
Trata-se de uma narrativa de suspense policial, contada com o auxílio de flash back, que me manteve atenta e distante do sono. Um filme de Hollywood, com atores talentosos e bonitos e interpretações que não decepcionam. Aliás, a cena da personagem de Julia Roberts (Jess) com a filha morta na caçamba foi emocionante.
Acompanhei cena a cena a investigação do personagem de Chiwetel Ejiofor, o agente do FBI, para tentar prender, 13 anos depois, o assassino da filha de sua colega investigadora Jess, mas não percebi que era um remake do filme argentino "El Secreto de Sus Ojos" (O Segredo dos Seus Olhos), de Juan José Campanella, estrelado por Ricardo Alberto Darín e Soledad Villamil e vencedor do Oscar de Melhor Filme Estrangeiro em 2010.
Somente na etapa final, quando a amargurada e envelhecida Jess dirige-se para uma construção estranha, nos fundos de sua casa, é que intuí que a história se assemelhava ao belo e premiado filme argentino.
Primeiro, pensei em plágio. Depois (não vou contar a cena), cheguei à conclusão de que era um remake, ou seja, um filme intertextual.
De maneira geral, não há plágio nesse tipo de composição dialógica, no sentido do termo cunhado por Mikhail Bakhtin, "principalmente", como já disse o compositor e escritor Bráulio Tavares (em: A cereja do bolo narrativo, revista Língua Portuguesa, dez. 2011), "se os
novos adornos (...) tiverem riqueza bastante
para se imporem sobre a mecânica antiga”.
Na versão de Billy Ray, o esqueleto do enredo do filme de Campanella está todo ali, mas a história contada é outra. É como se novos personagens vivessem um fato semelhante ao já vivido por outros personagens. A esse processo, a búlgara naturalizada francesa Julia Kristeva denominou intertextualidade, a criação de um novo texto a partir outros textos já existentes.
No fim das contas, o filme argentino também é intertextual, porque se baseia no livro de Eduardo Sacheri, "La Pregunta de sus Ojos", publicado em 2005.
Nesse caso, a arte segue as leis da natureza, pois, como explicou o químico Antoine Laurent Lavoisier, no século XVIII, "na natureza, nada se cria, nada se perde, tudo se transforma", no que foi parodiado por Chacrinha, no século XX: "Na televisão, nada se cria, tudo se copia". Na realidade, o valor da arte está na criação, ou na recriação, mas nunca na cópia, pura e simples.
Quanto à minha preferência em relação aos dois filmes, não tenho dúvidas: o argentino é muito melhor, porque causa impacto. É trágico, mas é poético, criativo e original.
Leia o que escrevi em 2010 sobre O Segredo dos Seus Olhos.
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domingo, 16 de outubro de 2016
O filme norte-americano "Olhos da Justiça" recria o argentino "O Segredo dos Seus Olhos"
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